01/09/2020

Como impugnar laudos judiciais desfavoráveis nas ações que buscam auxílio-doença e aposentadoria por invalidez?

É bem desanimador quando você junta laudos e documentos médicos declarando a incapacidade do seu cliente e, mesmo assim, a perícia judicial afirma que ele é capaz, não é mesmo?

Quando acontece, a gente fica pensando em como impugnar um laudo feito por um médico, já que nós (ou a grande maioria de nós) não tem formação suficiente para isso.

Mesmo assim, muitas vezes não só é possível como necessário fazer tal impugnação. E isso sem necessidade de aventurar-se pelo campo desconhecido da medicina.

É que em alguns casos o laudo judicial no máximo cita a existência dos documentos médicos particulares que dão conta da incapacidade. Às vezes, nem mesmo citam.

Será possível que um médico possa invalidar o diagnóstico de outro, exclusivamente sob a alegação de que um é “de confiança do juízo” e o outro “tem ligações emocionais com o paciente”, como a gente lê por aí?

É claro que não.

Laudo Judicial

O laudo judicial tem que fundamentar, motivar, apontar as razões técnicas pelas quais os documentos particulares devem ser desprezados. Não basta arrolar e dizer que “foram considerados”. Citar é uma coisa; desqualificá-los por falta de técnica é outra, bem diferente. Afinal, inúmeras vezes o médico particular é, também, um especialista (ortopedista, psiquiatra, reumatologista, entre outros).

Uma perícia só é marcada quando necessário “conhecimento especial de técnico”, como se lê, por interpretação inversa, do art. 464, §1°, I, do CPC.

Conhecimento técnico

Ora, o conhecimento técnico existe em ambos os documentos, tanto no laudo judicial como no documento médico do cliente. Se os dois têm conclusões opostas – um dizendo que o paciente é incapaz e o outro que ele é plenamente capaz -, para que o primeiro, o laudo judicial, prevaleça, é preciso que demonstre de forma fundamentada a sua superioridade.

Naturalmente, tal superioridade tem que ser técnica, não servindo argumentos de autoridade do tipo “prevalece pois é perito” ou “vale este porque é de confiança do juízo”.

Argumento de autoridade não combina com ciência. Serve para impor conclusões, mas não para gerar conclusões racionalmente válidas, fundamentadas, como são obrigatoriamente todas as manifestações, pedidos e decisões dentro de um processo judicial.

Laudo desfavorável em processos previdenciários

Notem uma coisa importante, embora quase nunca levada em conta nos processos previdenciários: a exigência de que os laudos particulares sejam justificadamente descartados está na própria regulamentação do CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, cujo Parecer n.º 10, de 23 de março de 2012, tem a seguinte ementa (que também é sua conclusão): “O médico do trabalho pode discordar dos termos de atestado médico emitido por outro médico, desde que justifique esta discordância, após o devido exame médico do trabalhador, assumindo a responsabilidade pelas consequências do seu ato.”

Como decidido no Processo n. 5002173-72.2015.404.7004, rel. Juíza Federal Flávia da Silva Xavier, da 3ª Turma Recursal do Paraná, “o laudo técnico pericial deve conter, pelo menos: as queixas do periciando; a história ocupacional do trabalhador; a história clínica e exame clínico (registrando dados observados nos diversos aparelhos, órgãos e segmentos examinados, sinais, sintomas e resultados de testes realizados); os principais resultados e provas diagnósticas (registrar exames realizados com as respectivas datas e resultados); os prováveis diagnósticos (com referência à natureza e localização da lesão) e prognóstico; o significado dos exames complementares em que apoiou suas convicções; as consequências do desempenho de atividade profissional à saúde do periciando”.

Se o laudo judicial não justificou a razão pela qual os seus documentos pela incapacidade não têm valor científico e técnico, ou não incluiu as informações acima citadas, o correto é pedir a complementação do laudo.

Afinal, como o art. 473, II e III, do CPC, exige que o perito exponha a “análise técnica ou científica” e “o método utilizado”, você pode e deve requerer seja novamente ouvido o perito judicial, na forma do art. 473, §2º, I, para que apresente seus fundamentos específicos sobre a rejeição dos documentos médicos particulares.

Se o pedido não for deferido pelo juiz, há cerceamento de defesa, que poderá levar a anulação da sentença que vier a acolher o laudo sem fundamentação.

Se for deferido e o perito insistir em dizer que nada há que ser acrescentado, também será nula a sentença, já que sua razão de decidir – o laudo judicial -, será ela própria nulo, uma vez que lhe faltará a “análise técnica ou científica” a que alude o citado art. 473, II, do CPC, bem como ficará claro o desrespeito ao mencionado Parecer n. 10 do Conselho Federal de Medicina.


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